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Trombose Venosa Cerebral

Trombose Venosa Cerebral – Sintomas, causas, tratamento e recuperação

Você sabia que existe um tipo especial de AVC que afeta principalmente mulheres jovens? A trombose venosa cerebral é uma doença grave causada pela formação de trombos nas veias cerebrais e acomete principalmente mulheres jovens, mas também pode acontecer em homens e pessoas mais velhas.

Por ser uma doença rara com sintomas comuns, o diagnóstico pode demorar a ser feito, o que atrasa o tratamento e diminui as chances de recuperação e cura.

Nesse artigo, falamos sobre o que é a trombose cerebral, quais suas causas, seus sintomas, como é o diagnóstico e sobre a importância de tratar rapidamente para evitar maior gravidade.

O que é Trombose Venosa Cerebral?

Trombose venosa cerebral (TVC) é uma doença causada pela formação de coágulos ou trombos nas veias do cérebro. A presença desses trombos dificulta a saída de sangue do cérebro e leva ao aumento da pressão intracraniana, com risco de isquemias, sangramentos, danos à visão e outras consequências graves.

Para entender melhor, precisamos relembrar alguns conceitos. Temos dois tipos de vasos sanguíneos: as artérias e as veias. As artérias levam sangue ao cérebro, carregando oxigênio e nutrientes. Após passar pelo tecido cerebral, o sangue retorna ao coração pelas veias e seios venosos. Os seios venosos são dobras da membrana que recobre o cérebro. São estruturas grandes que recebem sangue de veias menores. Dos seios venosos, o sangue vai para as veias do pescoço, como a veia jugular, e depois retorna ao coração. Quando temos a formação de trombos nas artérias, o resultado é o AVC isquêmico. Quando o trombo se forma nas veias, temos a trombose venosa cerebral, chamada também de TVC.

A TVC é um tipo diferente e raro de AVC – corresponde a menos de 1% de todos os casos.

Apesar de apenas cerca de 2 a cada 100 mil pessoas serem diagnosticadas com trombose cerebral anualmente, temos observado que a doença está se tornando mais comum nos últimos anos.

É uma doença que afeta principalmente pacientes jovens e mulheres e que pode provocar grande variedade de sintomas, desde dores de cabeça até coma e morte, como veremos a seguir.

Infográfico mostrando como é a trombose venosa cerebral
Na trombose venosa cerebral, trombos se formam nos seios venosos e impedem a saída de sangue do crânio.

Qual a causa da trombose venosa cerebral?

A trombose venosa cerebral é causada por combinações de fatores que juntos aumentam o risco de trombos nas veias, como trombofilias, uso de medicamentos e doenças associadas.

O nosso corpo vive em um equilíbrio de fatores que aumentam a chance de coagulação e fatores que impedem a coagulação. Quando esse equilíbrio falha e os fatores pró coagulação predominam, temos a formação de trombos.

Assim, dizemos que algumas pessoas têm predisposição a terem tromboses. Quando alguns “gatilhos” se juntam, a trombose pode acontecer. Em muitos casos, uma mesma pessoa pode ter mais de um fator de risco ou causa para a trombose

As principais causas da TVC são:

  • Trombofilias (doenças que aumentam a coagulação)
  • Uso de anticoncepcionais orais combinados (pílulas): é o fator de risco mais frequente em mulheres jovens
  • Obesidade
  • Câncer e alguns quimioterápicos
  • Leucemia aguda
  • Terapia de reposição hormonal
  • Gravidez e puerpério
  • Infecções, principalmente meningites e infecções na face e ouvido (otite)
  • Doenças inflamatórias e autoimunes
  • Infecção por COVID-19
  • Traumas

Além dos fatores acima, o sexo feminino aumenta em até 3 vezes a chance de ter trombose. Acredita-se que o risco maior é pela presença de estrogênio, hormônio produzido naturalmente pelas mulheres e presente em certos tratamentos, como anticoncepcionais e reposição hormonal, e por fatores como gravidez e puerpério.

Em até um terço dos casos, não identificamos nenhum fator de risco para a trombose.

COVID-19 e a trombose venosa cerebral

Com a pandemia, descobrimos novas causas para trombose cerebral. A infecção por COVID-19 pode predispor trombose intracraniana e em outros locais.

Nesses casos, a trombose parece ser particularmente grave, com mortalidade muito maior que nos casos de TVC sem COVID-19. Felizmente é muito rara: calcula-se que acontece em 0,08% dos casos de COVID-19 internados.

Além da infecção, certas vacinas (com destaque para a fabricada pela AstraZeneca) podem provocar resposta imune do organismos e causar trombose e queda das plaquetas (trombocitopenia). Essa condição ficou conhecida como VIIT (trombocitopenia trombótica imune induzida por vacina). Pode acontecer até 6 semanas após a vacinação, mas são ainda mais raras: cerca de 1 a 4 casos por milhão de doses. Ou seja, o risco de trombose pela doença é maior que pela vacina.

A vacina da AstraZeneca não está mais disponível no Brasil.

Quais são os sintomas da trombose venosa cerebral?

A trombose venosa cerebral pode ter diferentes sintomas dependendo da sua extensão e gravidade. Apesar de ser bastante variável, um sintoma importante está presente em quase todos os pacientes (90%): dor de cabeça!

A dor de cabeça da TVC pode se iniciar leve e piorar de intensidade ao longo dos dias. Costuma ser difusa em todo o crânio e pode piorar ao tossir ou deitar, vir junto com náuseas e vômitos e ser muito forte. Uma característica que sempre chama atenção e deve levantar suspeita de trombose cerebral é o surgimento de dor de cabeça frequente em quem não costumava ter ou a mudança de padrão em quem já tem dor de cabeça.

Dor de cabeça nova ou que mudou de característica é um sinal de alarme para investigar trombose venosa cerebral e outras doenças.

Diferente do AVC isquêmico, na trombose cerebral, os sintomas podem se iniciar leves e piorar ao longo de dias ou semanas.

Os principais sintomas da trombose venosa cerebral são:

Veja também: quando a dor de cabeça pode indicar uma doença mais grave

A trombose venosa cerebral é grave?

Sim, a trombose cerebral pode ser muito grave. Alguns casos de trombose podem evoluir com inchaço do cérebro (edema cerebral), morte de neurônios por isquemia e hemorragia cerebral. 

Os sintomas e a sua gravidade dependem da localização e de quantos seios venosos e veias estão obstruídos, da idade do paciente, da velocidade de progressão de trombose, entre outras características.

Quando a trombose é extensa e persiste por muito tempo, o sangue com dificuldade de deixar a cabeça acumula-se, aumenta a pressão dentro do crânio e passa a comprimir outras estruturas, como nervos e o próprio cérebro.

Conforme a trombose se mantém, neurônios deixam de receber nutrientes e oxigênio e morrem, no que chamamos de infarto venoso. Pequenas veias podem se romper e causar AVC hemorrágico. Ambas as situações pioram o prognóstico, aumentando a chance de sequelas.

Diagnóstico de trombose venosa cerebral

O primeiro passo para diagnosticar trombose venosa cerebral é suspeitar. Por isso, a avaliação de um neurologista especializado é importante. Com base na história e nos sintomas, são indicados exames específicos que permitem ver o trombo dentro das veias ou a falha na passagem do sangue.

O diagnóstico muitas vezes é difícil e a experiência em trombose venosa cerebral faz a diferença. Avaliamos os sintomas, como eles apareceram e evoluíram, antecedentes pessoais e história familiar, além do exame físico neurológico. Com a suspeita clínica, partimos para exames complementares.

Vários exames de imagem podem detectar a trombose.

Em alguns casos, a tomografia de crânio simples já pode levantar a suspeita ao mostrar o trombo como uma lesão branca (que chamamos de hiperdensidade) na região onde deveria estar circulando sangue. Além disso, existem alguns padrões de sangramento ou isquemia que indicam a possibilidade de trombose.

Outra vezes, só é feito o diagnóstico com exames específicos, como a angiotomografia venosa e, principalmente, a angioressonância venosa por ressonância magnética.

A tomografia e a ressonância podem diagnosticar a trombose venosa cerebral.
Exemplo de angiotomografia que mostra trombos identificados por setas. Nesse caso, nos lugares sinalizados, não vemos o preenchimento por contraste (cinza) porque o trombo obstrui a passagem de sangue.

Esses exames podem identificar o trombo e a falta de circulação de sangue na sua localização, como na imagem acima. Em casos de dúvidas, a angiografia cerebral por cateter pode ajudar, mas geralmente é realizada apenas em casos específicos.

Um diagnóstico importante que pode se confundir com a trombose cerebral é a hipertensão intracraniana idiopática. A avaliação clínica e os exames ajudam a diferenciar as duas condições, que têm causas e tratamentos diferentes.

Tratamento da trombose venosa cerebral

O tratamento da trombose venosa cerebral consiste principalmente na anticoagulação, que deve ser iniciada o mais rapidamente possível, idealmente por via endovenosa ou subcutânea e, após, trocada por via oral.

Anticoagulação com heparina subcutânea para trombose venoa cerebral.
A anticoagulação por via subcutânea é um dos principais tratamentos para trombose cerebral.

Como a trombose nada mais é do que a presença de trombos/coágulos dentro dos seios venosos e veias cerebrais, os medicamentos anticoagulantes atuam para desfazer os trombos e evitar sua expansão.

O atraso em iniciar o tratamento pode aumentar a gravidade da doença, dificultar a recuperação e aumentar a chance de sequelas.

Pelo seu efeito mais rápido e de melhor controle, o tratamento preferencialmente é feito com medicamentos injetáveis, como heparina e enoxaparina. Após alguns dias, trocamos por anticoagulantes orais, como varfarina ou outros mais novos, como dabigatrana.

O tratamento é iniciado em regime de internação, pois precisamos manter cuidado e acompanhamento de perto para observar a melhora, prevenir e tratar complicações.

Outros tratamentos para trombose cerebral

Casos muito graves podem ter piora progressiva sem resposta satisfatória à anticoagulação. Nessas situações, a trombectomia mecânica da trombose venosa pode ser uma opção. 

Trata-se de um procedimento minimamente invasivo em que um neurorradiologista intervencionista retira os coágulos dos seios venosos por meio de cateteres. É um procedimento de exceção e, apesar da retirada dos trombos, a anticoagulação continua sendo necessária.

Outra situação grave é quando ocorre inchaço ou sangramentos extensos, com risco de lesões secundárias ou morte. Nessas situações, cirurgias para drenagem do sangramento ou para descomprimir o cérebro (craniectomia descompressiva) podem ser indicadas.

Quais as sequelas e como é a recuperação da trombose cerebral?

As sequelas da trombose venosa cerebral podem ser mínimas ou até nenhuma, dependendo do tratamento adequado e da extensão da trombose. Na maior parte dos casos, os pacientes têm boa recuperação.

No entanto, alguns casos são mais graves, com maior chance de deixar sequelas, como quem teve hemorragia ou isquemia cerebral como consequência da trombose. As sequelas podem ser fraqueza, alteração de sensibilidade de um lado do corpo, crises convulsivas, dor de cabeça e alteração de memória.

A gravidade dessas sequelas depende da própria gravidade da doença e a reabilitação com equipe multidisciplinar é essencial.

Estudos mostram que até 80% dos pacientes se recuperam total ou quase totalmente. A mortalidade na fase aguda é de cerca de 4%. Mulheres jovens geralmente têm bom prognóstico.

Também é importante identificar e tratar a causa da trombose porque isso também influencia na recuperação da doença e no risco de ter uma nova trombose no futuro.

Investigação das Causas e Prevenção da Trombose Venosa Cerebral

Como já falamos, a TVC pode ter várias causas que juntas levam a doença. Assim, após o cuidado inicial, é fundamental investigar os motivos que levaram a trombose a acontecer. O especialista em trombose venosa cerebral deve solicitar exames complementares para essa avaliação.

Com base nisso, a duração do tratamento e as estratégias para prevenir novas tromboses podem ser definidas.

Fatores transitórios ou reversíveis, como a gravidez e o uso de anticoncepcionais, podem ser revertidos e necessitam de anticoagulação por tempo limitado.

Por outro lado, pacientes que têm doenças crônicas como as trombofilias podem precisar de anticoagulação para sempre como forma de prevenir novas tromboses.

Fontes:
UpToDate
Diagnosis and Treatment of Cerebral Venous Thrombosis – Continuum Lifelong Learning in Neurology

Publicado originalmente em 29/08/2022. Atualizado em 06/05/2023.

9 comentários em “Trombose Venosa Cerebral – Sintomas, causas, tratamento e recuperação”

  1. Achei o texto bem didático e explicativo. Eu passei por uma TVP cerebral em fevereiro e estou em investigação de trombofilia. Tenho lido muitos artigos e até o momento esse foi um dos mais completos.

  2. Dr. Luiz, a TVC pode estar interligada e questões ocupacionais? contribuída com os fatores de risco em ambientes hospitalares, assédios e etc?

      1. Há 15 dias fui diagnosticada com TVC e desde então tenho pesquisado sobre o assunto, este foi o texto mais bem explicado sobre a doença até agora, foi de grande ajuda.
        Muito obrigada Dr. Luiz Fernando.

  3. Boa noite Dr. Luiz Fernando, acabei de ler o meu laudo da TC pela internet. E a unuca coisa que li diferente foi: Aparente hiperdensidade do seio reto. A critério clínico, correlacionar com angioTC venosa do crânio. O sr. Poderia me ajudar?

  4. Olá, tudo bem?
    Tenho um amigo internado devido a TVC, está em uso de anticoagulante conforme prescrição na unidade hospitalar. Relata melhora da cefaleia, mas está em uso e tramadol uma ampola a cada 12h. Porém a visão continua turva sem melhora desde o inicio do tratamento. Com quantos dias acha possível obter melhora?

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